O caminho que temos pela frente: desenvolvimento como inovação

Geoff Mulgan

É director executivo do Nesta desde 2011. Entre 1997-04, assumiu vários cargos governativos, nomeadamente o de director da Unidade Estratégica do Governo e chefe de política do Gabinete do Primeiro-Ministro britânico. De 2004-11, foi director executivo da The Young Foundation. Foi jornalista na BBC (TV e rádio) e professor na London School of Economics, UCL e Universidade de Harvard,
sendo actualmente professor em Harvard.

Porque é que a inovação importa para o desenvolvimento? Neste ensaio, sugiro algumas respostas. Procuro demonstrar porque é a inovação está cada vez mais a ser entendida como parte integrante de qualquer processo de desenvolvimento. O desenvolvimento não implica apenas a sua adopção; também envolve a adaptação activa e o estímulo de novas ideias. Demonstro o porquê deste reconhecimento ter despertado grande interesse no papel das instituições para a inovação em países em desenvolvimento, não só na ciência ou tecnologia, mas também na sociedade e governo. Sublinho o papel que a inovação poderá ter na reanimação da indústria do desenvolvimento que enfrenta vários desafios e críticas. Finalmente, termino com uma reflexão sobre a relação entre inovação e liberdade.

 

Inovação como parte integrante do desenvolvimento

De acordo com os economistas, cerca de três quartos de todo o crescimento económico provém da invenção e adopção de novas ideias.[1] As empresas inovam para sobreviver. O mesmo aplica-se às forças armadas, aos partidos políticos e às instituições sem fins lucrativos, aos governos e aos laboratórios de pesquisa, movimentos sociais, inventores de base e activistas políticos: todos eles tentam criar novas ideias que “colem”, para que possam sobreviver, e esperançosamente, prosperar.

Este padrão – que começa com criatividade, experiência e verificação, passa depois por uma espécie de teste no mundo real, e leva à propagação de uma minoria de novas ideias que funcionam – é encontrado em diversos níveis nas práticas agrícolas, na medicina, e na gestão burocrática. De facto, os processos evolucionários que relacionados com mutações, selecção e de seguida replicação, são um padrão bastante universal.

Tradicionalmente, o desenvolvimento é visto como algo que envolve apenas a última parte deste processo – adoptando novas ideias que tenham nascido e sido experimentadas noutro lugar. As teorias não lineares de desenvolvimento social são menos populares hoje do que alguma vez foram. Mas continuam implícitas em muita da literatura de desenvolvimento. Se alguma sociedade pudesse ser pensada como sendo constituída por vários ‘sistemas de produção’, que produzem roupa, conhecimento, saúde, habitação ou energia, então o desenvolvimento seria sobre trazer cada sistema para a ‘fronteira de produção’, adoptando os melhores métodos disponíveis. Isto seria real tanto nas actividades primárias como a mineração, o tratamento médico ou o ensino, como nas actividades secundárias, tais como a construção de mercados e sistemas legais, ou a administração de governos.

Sempre houve vários argumentos para ter em conta como o que é ‘melhor’, ou o que é acessível, ou o que é apropriado aos diferentes estágios. Mas uma boa dose de realidade diária de desenvolvimento numa vila em Sumatra ou numa cidade na Tanzânia pode ser compreendida nesses termos.

Esta perspectiva agora parece radicalmente incompleta. Embora seja bom pedir empréstimos aos outros, e toda a história humana esteve envolvida em copiar dos vizinhos e dos inimigos, a adopção nunca é directa. Em vez disso, a adopção funciona melhor quando é aliada à capacidade de adaptar e criar, quer o foco seja em máquinas de vedação e métodos de irrigação, ou em telemóveis e energia solar. Os melhores inovadores são também em muitos casos quem melhor adopta e vice-versa. Ambos requerem uma mentalidade flexível e ávida de aprender, experimentar e adaptar.

O conjunto de ferramentas – como apoiar a inovação

Se a inovação importa, e não é mais um monopólio do mundo rico, a atenção tem que se virar para a melhor forma de a apoiar. A inovação é frequentemente mencionada de uma forma abstracta, em orientações demasiado generalistas. Na Nesta, usamos uma simples estrutura para incentivar uma maior precisão nas diferentes fases que podem ser encontradas em quase todos os processos de inovação, quer seja num campo como o da medicina, ou o dos negócios, e ver de que forma estes podem serem apoiados.[2]

Estes processos começam com a capacidade de observar e ouvir, compreender as mudanças nos padrões de necessidades (tais como a propagação da Ébola) ou novas oportunidades (tais como a omnipresença dos smartphones). De seguida vem a geração de ideias, cada vez mais variadas, que tendem a ficar melhores. O próximo estágio olha para a evidência – descobrindo se as ideias realmente funcionam. Se funcionarem, podem ser postas em prática, seja no trabalho de uma organização comunitária, na governação ou num negócio. Se as ideias forem realmente boas, podem ganhar escala e serem disseminadas. Finalmente, as melhores inovações de todas pressupõem um repensar de todos os sistemas – desde os sistemas de produção alimentar aos sistemas monetários.

Espiral de inovação social [3]
Esta figura é bastante estilizada. O mundo real da inovação é mais confuso do que isto, repleto de saltos e voltas, assim como de muros de bloqueio. Mas é um instrumento útil para ser mais preciso sobre os tipos de acção e de suporte que funcionam melhor em cada fase, e os ensaios desta colecção mostram precisamente o quão rica é actualmente a variedade de métodos utilizados nos diferentes estágios.

Desta forma, por exemplo, os mercados competitivos são bons a implementar ideias, mas inadequados para fazer investigação fundamental. Os métodos de planeamento podem ser excelentes para gerar ideias, mas são frequentemente muito mais pobres a ajudar as ideias a encaixar nas restrições organizacionais e económicas. Os métodos de investimento social são excelentes para escalar outros tipos de inovação, mas de pouco servem num estágio inicial de descoberta. Os métodos de pesquisa formais têm um papel a desempenhar em cada estágio, mas surgem na realidade quando as ideias maduras estão a ser avaliadas.

Estas diversas capacidades são agora muito mais fortes, estão mais distribuídas do que antes, e figuram como uma das razões pelas quais a inovação se tornou mais multipolar, do que apenas uma emanação linear de alguns centros desenvolvidos. O dinheiro móvel do leste africano, a supercomputação chinesa, o software indiano, os modelos de orçamento participativo brasileiros – todos, de diferentes formas, estão a explorar as fronteiras de produção assim como estão a adaptar ideias nascidas noutros lugares.

O papel das políticas

À medida que a inovação tem vindo a ser parte integrante do desenvolvimento, a atenção tem-se virado para o trabalho feito por instituições especializadas – agências, financiadores e laboratórios – que se especializam em encontrar, estimular e fazer crescer boas ideias. Muitas destas conduzem a invenções científicas, e a sua tradução em tecnologias úteis. Países como China e Índia tem um conjunto ambicioso de objectivos para aumentar os gastos em I&D (Investigação e Desenvolvimento), e têm desafiado as fronteiras, seja para a genómica (no caso da China) ou para a tecnologia espacial mais acessível (no caso da Índia).

À medida que a inovação tem vindo a ser parte integrante do desenvolvimento, a atenção tem-se virado para o trabalho feito por instituições especializadas – agências, financiadores e laboratórios – que se especializam em encontrar, estimular e fazer crescer boas ideias

A Nesta documentou os métodos inovadores utilizados pelos governos em todo o mundo, desde o Silicon Valley à Alemanha, à China[4] e à índia[5] até ao Brasil, em parte para ajudar os governos a adoptar as ferramentas que melhor sirvam as suas necessidades. As políticas de inovação podem ser complexas: por vezes motivadas pela glória, outras vezes reflectindo a captura de interesses muito especiais, e frequentemente dominados pelos militares.

Ainda assim algumas das ferramentas são bem sustentadas por evidências, e os governos podem basear-se nessas evidências para decidir se deveriam seguir outros países na adopção de taxas fiscais para I&D, nos gabinetes de transferência tecnológica nas universidades ou nas reformas de contratação pública.[6] Outros métodos, pelo contrário, têm tido um escrutínio relativamente pouco sério (e, por isso, é que a Nesta construiu este Innovation Growth Lab, agora apoiado por dezenas de países, para testar rigorosamente os métodos de apoio ao empreendorismo em inovação).[7]

Há uma geração atrás, a inovação era principalmente mencionada na sua relação com a tecnologia, fosse na forma de grande ciência dos rockets e mísseis ou numa forma mais “descalça” de tecnologias intermédias. Mas um dos padrões mais intrigantes da última década foi a propagação de métodos de inovação para novos campos. Alguns governos, por exemplo, agora aplicam métodos de inovação nas suas próprias operações, como forma de se livrarem dos constrangimentos da burocracia dos séculos XIX e XX. Há outros grandes exemplos, como o projecto UID da Índia, e centenas de equipas tecnológicas e laboratórios a trabalharem em conjunto com governos locais e nacionais, desde o Peru até às Filipinas, procurando utilizar a criatividade, dando mais atenção aos dados e evidências e às melhores rotas para ganhar escala.[8] São ferramentas importantes para aumentar a produtividade e melhorar a capacidade para resolver problemas. Mas também são importantes devido à cultura que trazem: mais aberta, humilde e colaborativa que o ministério tradicional.​

Inovação na indústria do desenvolvimento

Desde que a inovação se tornou parte integrante da forma como pensamos o desenvolvimento, a indústria do desenvolvimento tem vindo a estar debaixo de um escrutínio mais intenso. Não se deve à falta de pessoas criativas. Mas tem sido lenta a aplicar métodos de inovação no seu seio, seja nos seus papéis mais directos (como responder a guerras civis ou à fome) ou nos mais indirectos (como apoiar a educação ou saúde, a justiça ou governação).

É assim que se começa a mudar, e a indústria do desenvolvimento está cheia de iniciativas com a palavra inovação: o Global Innovation Fund, os laboratórios de inovação do UNICEF, o Development Innovation Ventures e muitos outros. Estes estão situados em vários pontos da espiral da inovação – alguns muito ligados à geração de ideias (como a utilização de planos centrados nas pessoas), alguns à evidência (tais como a Innovation Poverty Action ou Results for Development[9]), e ainda alguns focados na escala (tais como os development impact bonds).

É demasiado cedo para reivindicar um novo modelo de desenvolvimento, coerente e sistematizado. Mas há alguns temas comuns. O ethos geral é o da inovação aberta – abrir as questões e desafios a todos os intervenientes, em vez de direccionar recursos apenas para as universidades de elite ou centros de investigação consagrados. Existe uma ênfase no poder do povo, na democracia, no seu sentido mais amplo, quer isso signifique maior envolvimento dos cidadãos na concepção e gestão de serviços ou experiências formais como os orçamentos participativos e a democracia. Isto tem sido estimulado pelo crescente interesse em tecnologias digitais económicas e ubíquas, desde smartphones e satélites até machine learning e novas formas de organização financeira, de doações e empréstimos a acções e títulos.

Um dos papéis da Nesta tem sido ajudar o mundo do desenvolvimento a usar e adaptar ferramentas e ideias desta natureza, e a adoptar percepções que vão além das fileiras dos suspeitos do costume. Estas ferramentas incluem prémios e estímulos (usados, por exemplo, para desenvolver energia renovável para comunidades de refugiados, ou para combater a resistência a antibióticos[10]); aceleradores para melhorar a qualidade dos negócios das startups (propagando-as, por exemplo, pela Índia);[11] e programas de open data para ajudar os cidadãos a ter mais acesso a informação pública que estava ocultas até então. Desenvolvemos um conjunto de ferramentas e formação para desmistificar a inovação e as capacidades de crescimento (grow skills), ajudados por publicações como o DIY toolkit[12] e os guias para prémios[13] ou o uso de evidências. Reflectindo o nosso próprio trabalho –que envolve uma colaboração próxima com grandes empresas (tais como a Google ou a Pearson) assim como startups, governos e ONG – tendemos a enfatizar as mais-valias de trabalhar nas fronteiras organizacionais e sectoriais.[14]

Nenhum destes métodos é uma panaceia, e os profissionais estão certos em estarem cépticos em relação aos multimilionários de Silicon Valley que desenvolvem uma app resolver a pobreza, e aos profissionais caríssimos que vão para um país pobre para resolver a desnutrição. A inovação é um campo onde tudo é propenso ao hype, e a modas passageiras, e o que é novo nem sempre é o melhor. Mas sem inovação sistemática e deliberada, qualquer área está destinada a estagnar e a perder oportunidades.

Teoria prática de liderança

Uma das intrigantes implicações destas abordagens emergentes é a relação radicalmente diferente entre a teoria e a prática. Até há relativamente pouco tempo, o desenvolvimento significava aplicar a teoria à prática. As teorias formuladas por economistas eminentes, cientistas políticos e da ciência social. O seu conhecimento destilou a experiência confusa de países como o Reino Unido, a Alemanha, os EUA e o Japão em formas accionáveis que poderiam orientar as decisões dos ministérios das finanças e da educação nos países mais pobres. Mas essas teorias raramente estavam fundamentadas em investigação empírica, e nunca foram formalmente testadas.

Hoje esse modelo está parcialmente virado do avesso. Em vez de dependerem de um caminho linear da alta teoria para a prática em si, o desenvolvimento começou a adoptar métodos da inovação quotidiana, descobrindo novos métodos através da experimentação. Ideias baseadas nas teorias, ou melhor, teorias. Mas não há a presunção de que só porque uma ideia funciona no papel, também irá funcionar na prática. Em vez disso, nesta perspectiva, o mundo aprende a testar as coisas, e o trabalho da teoria torna-se tanto o de dar sentido à prática quanto o de a orientar. As melhores ideias podem provir de aldeias, das equipas na linha da frente, das ONG e de empreendedores, em vez dos especialistas. O conhecimento surge mais deste engajamento com a confusa realidade do mundo do trabalho do que com a contemplação desprendida. A primazia da prática também tem grandes implicações na forma como pensamos em ganhar escala e replicar. O que funciona num lugar, e num determinado momento, pode não funcionar tão bem noutro lugar ou noutro determinado momento, mesmo fazendo tudo da mesma maneira, como se provou ser o caso do microcrédito aplicado em determinadas aldeias nos anos 90, as parcerias público-privadas nos anos 2000 ou a M-Pesa nos 2010. É apenas através da experiência prática que aprendemos o que pode ser disseminado e onde.

Pensamento colaborativo nos sistemas

A documentação mais simplista sobre inovação sugere que é suficiente inventar um novo método ou tecnologia, gerar evidências (possivelmente através de um RCT – Randomized Control Trials) e dar-lhes escala. Mas para muitos dos desafios mais complexos e emaranhados do desenvolvimento, estas abordagens são inadequadas.

Em vez disso, resolver problemas em contextos reais e confusos, onde estão presentes todas as complexidades da competição política, desigualdades a nível das capacidades e regras imprecisas, implica três tipos de capacidades. A primeira é capacidade de colaborar, formar coligações entre sectores e organizações, o que pode começar por ser antagónico. A segunda é a capacidade de adaptar, adoptar e criar – sabendo quando utilizar as soluções já existentes e quando inventar soluções feitas sob medida. A terceira é a capacidade de lidar com informação e evidências, reconhecendo com honestidade o que está e o que não está a funcionar, de modo a manter o foco nos resultados.

É difícil fazer todas estas coisas bem. Muitos líderes políticos e comunitários, especialistas e consultores, activos no campo do desenvolvimento são bons numa destas capacidades (por exemplo, os líderes são bons na convocação, as equipas de planeamento são boas em criatividade, ou os investigadores são fortes em evidências), e ocasionalmente em duas, mas muito raramente o são nas três capacidades, em simultâneo. Ainda assim, olhando para a frente, a capacidade de remodelar todos os sistemas de saúde, transporte ou educação, combinando inovação, colaboração e evidência, pode representar ganhos muito superiores do que a mera adopção de tecnologias ou métodos individuais.

Este é um campo onde novos e promissores métodos estão a emergir, por exemplo, no trabalho da Nesta com o Rapid Results Institute,[15] e o campo mais lato que tem rótulos como ‘resultados colaborativos’ e ‘impacto colectivo’. Tudo aponta para a aceleração da inovação em todos os sistemas, realçando a importância tanto das relações como das acções. Isto está longe de ser uma ciência (de facto, como sugeri num artigo recente, alguns dos métodos mais activamente promovidos parecem dar mais passos para trás do que para a frente).[16] Mas maneiras mais efectivas dos sistemas operarem são susceptíveis de se tornarem parte normal do conjunto de ferramentas da inovação no desenvolvimento como o trabalho de maior perfil em investimento social ou open data.

Desenvolvimento como inovação

A razão final para levar a sério a inovação é a de que a inovação é mais do que apenas uma ajuda ao desenvolvimento. Dois séculos de discussão acerca do que ajuda um país ou um lugar a tornar-se mais próspero não conseguiu definir o que conta como sucesso (é o rendimento, o bem-estar ou a igualdade?) ou o que é que explica o sucesso (que mistura de capital humano, capacidade, instituições e cultura é mesmo decisiva?).

Mas a inovação tem uma boa pretensão para oferecer uma resposta parcial para ambas as questões. Embora o desenvolvimento possa significar várias coisas – maior PIB per capita, democracia, ou a melhoria do IDH – o que realmente importa em todos os sentidos é a capacidade dos cidadãos em fazer e moldar o seu próprio mundo. Isto é a agência, ou liberdade, sobre a qual Amartya Sen escreveu décadas atrás.[17]

Uma sociedade rica em agência irá ser forte em cada estágio da espiral da inovação descrita anteriormente. E irá ficar bem colocada para se conhecer a si própria e às suas possibilidades. Quanto mais rico é o auto-conhecimento, suportado pela informação, investigação, open media e uma sociedade civil activa, mais bem-sucedida será. Estará capacitado para gerar novas ideias – e não dependerá apenas das que vêm dos líderes ou das elites. Podem ser ideias pequenas, assim como grandes ideias. Muitas poderão ser importadas ou adoptadas de outros lugares (como a Jane Jacobs assinalou, uma das características dos lugares mais prósperos é o facto de que são brilhantes a importar e a exportar ideias[18]).

Este conjunto de capacidades sobrepostas –que inclui a aptidão para dar escala às ideias, ou transformar sistemas inteiros – é certamente o que nós intuitivamente queremos dizer com desenvolvimento. É algo diferente do capital social de construção de estradas e arranha-céus, diferente do rendimento per capita, e diferente também de medidas como a esperança de vida ou a literacia, embora se correlacionem como todos estes indicadores. Em vez disso é a capacidade de criar, adoptar e adaptar.

Estas capacidades são, na sua raiz, sobre a inteligência colectiva. Ou seja, como é que qualquer comunidade aproveita a inteligência da sua gente?[19] As instituições fortes e densas ajudam as pessoas a ser mais do que a soma das suas partes. Empresas, mercados, universidades, imprensa livre e partidos políticos, todos eles, no seu melhor, ajudam grandes grupos a pensar e a agir. Um ambiente empresarial que acolhe empreendedores, startups e que permite ganhar escala, terá provavelmente mais sucesso do que um dominado por monopólios bem relacionados. Um sistema político, que confere espaço aos cidadãos para proporem, comentarem, debaterem e fazerem campanhas, será provavelmente mais bem-sucedido do que um sistema que seja fechado e monolítico.

A utilização de ferramentas que emergem da inteligência colectiva para ajudar países a navegar o seu caminho para o desenvolvimento é promissora. Existem muitas ferramentas novas, regra geral muito económicas, que podem ajudar uma comunidade a ter uma imagem mais nítida da sua posição actual e prospectiva – que podem permitir a milhares, em vez de a uma mão cheia, propor e debater opções. Isto pode transferir o trabalho de escrutínio que é feito pelos especialistas para os próprios cidadãos. Estes métodos ainda estão numa fase embrionária, e a inteligência colectiva irá significar muitas coisas diferentes em sociedades frágeis com Estados fragmentados e em sociedades ricas com instituições de confiança. Mas existe ao menos alguma perspectiva que estes países ultrapassem os sistemas de governação estagnados dos países mais ricos.

A interpretação do desenvolvimento como inovação é simples, mas desafiante. Sim, o mundo do desenvolvimento deveria estar a adoptar e adaptar ferramentas de inovação para remodelar as suas práticas, incluindo novas formas de organizar as finanças, evidências, informação e os contributos dos cidadãos. E, sim, cada país deveria estar também a construir a sua própria capacidade de inovação, apoiando a germinação e evolução de ideias em cada fase. Mas o prémio final é ver o próprio desenvolvimento de uma nova perspectiva, como uma forma de liberdade individual e colectiva que se manifesta na capacidade de criar e espalhar conhecimento novo e útil. Parafraseando Amartya Sen, isto é desenvolvimento como inovação: aberto, democrático, inclusivo e livre.

 

Notas

[1] Índex de Inovação da Nesta, ver: http://www.nesta.org.uk/project/innovation-index

[2] Murray, R., Cauler-Grice, J. and Mulgan, G. (2010) ‘The Open Book of Social Innovation.’ London: Nesta and The Young Foundation. Acesso: http://www.nesta.org.uk/publications/open-book-social-innovation

[3] http://www.nesta.org.uk/publications/open-book-social-innovation

[4] http://www.nesta.org.uk/publications/chinas-absorptive-state-innovation-and-research-china

[5] http://www.nesta.org.uk/publications/our-frugal-future-lessons-indias-innovation-system

[6] Este site fornece uma visão abrangente das evidências sobre política de inovação: http://www.innovation-policy.org.uk/

[7] http://www.nesta.org.uk/project/innovation-growth-lab-ig

[8] Veja o newsletter em: http://www.nesta.org.uk/Lab-Notes and iteams.org

[9] http://www.resultsfordevelopment.org/

[10] http://www.nesta.org.uk/project/longitude-prize

[11] http://www.nesta.org.uk/publications/good-incubation-india

[12] http://diytoolkit.org/

[13] http://www.nesta.org.uk/publications/challenge-prizes-practice-guide

[14] http://www.nesta.org.uk/blog/winning-together-guide-successful-corporatestartup-collaboration

[15] http://www.nesta.org.uk/project/people-powered-results

[16] http://www.nesta.org.uk/blog/collaboration-and-collective-impact

[17] Sen, A. (1999) ‘Development as Freedom.’ Oxford: Oxford University Press.

[18] Jacobs, J. (1969) ‘The Economy of Cities.’ New York NY: Vintage.

[19] Mulgan, G. (2014) True collective intelligence: a sketch of a possible new field. ‘Philosophy & Technology.’ March 2014, Volume 27, Issue 1, pp 133-142.

 

* Este artigo foi originalmente publicado em língua inglesa em “Innovation for International Development. Navigating the Paths and Pitfalls” editado em 2016 por Bem Ramaligan e Kirsten Bound da NESTA- The Innovation Foundation. O Mundo Crítico agradece à NESTA por ter autorizado a re-publicação deste artigo em língua portuguesa.